Almas de Sol
O divertimento constante dos segredos: almas de Sol.
A pansofia dos destinos, o caos inconsequente das palavras modernas, modernizadas e modernísticas, as pessoas andam estúpidas de sono, demasiado andarilhas, e a literatura remete-se à prontidão das vendas dos colossos embriagados. Assim, admiro-lhes, coitados, todos os momentos de mágoa e angústia esboçados em pequenas, pequeníssimas tragédias domésticas, como se fossem micronovelas, de assuntos ainda mais pequenos, mesquinhos, atrozmente ridículos, quase sem palavras. Há ou não há literatura? Há ou não há o género da vida que exercita palavras? Há, mas não se escreve. Há, mas fica calado. Há, mas isola-se dos meios de mediatificalizaminação.
A literatura é de todos, no entanto, esse estado fisiológico caracterizado pela insensibilidade dos sentidos e pelo repouso que proporciona, há quem lhe já tenha por morte ou sono eterno, impede a dádiva literária do povo, aqueles que transcendem o trânsito das cidades, a monotonia dos dias de trabalho, a incerteza do futuro, a impossibilidade da felicidade. A literatura é de todos, mas a literatura não está só nos livros, a literatura está na vida e em tudo o que lhe envolve. A vida, a vida nós sabemos o que é...
Se já não guardam rebanhos, se já não trabalham desde os seis anos de idade para ajudar ao sustento da família numerosa, se já não são analfabetos e vivem numa Europa, que livros e poemas andam a ler? Chateaubriand? Queirós? Pessoa? Rilke? Saramago? Tavares? Só os que lhes dão na escola... o famigerado templo do ensino. Mas quem disse que a literatura está na escola? Sim, claro, a escola faz parte da vida, logo a literatura também está na escola. Todavia, não será a literatura do templo do ensino supérflua e impositiva? A escola é apenas mais um eco do embaraço e desordem dos valores sociais, morais e literários do nosso tempo. É preciso acordar para a insurreição dos valores actuais da literatura! O que é que se ganha em ler? O que é que se ganha em pensar depois de ler? O que é que se ganha em escrever depois de pensar e de ler? Ninguém sabe. Contudo, gosto de acreditar que pela palavra se cria «iluminação», e é desta «iluminação» que todos precisamos para a vida: o conhecimento do Homem está na linguagem.
Incrédulo à passagem dos pensamentos, mais ou menos espirituais, divirto-me com as nuvens intentando maravilhosos novos mundos para lá da imaginação.
Não durmo, respeito-lhes o sono:
«Ler é maçada, estudar é nada.» Fernando Pessoa
Filipe de Fiúza
A pansofia dos destinos, o caos inconsequente das palavras modernas, modernizadas e modernísticas, as pessoas andam estúpidas de sono, demasiado andarilhas, e a literatura remete-se à prontidão das vendas dos colossos embriagados. Assim, admiro-lhes, coitados, todos os momentos de mágoa e angústia esboçados em pequenas, pequeníssimas tragédias domésticas, como se fossem micronovelas, de assuntos ainda mais pequenos, mesquinhos, atrozmente ridículos, quase sem palavras. Há ou não há literatura? Há ou não há o género da vida que exercita palavras? Há, mas não se escreve. Há, mas fica calado. Há, mas isola-se dos meios de mediatificalizaminação.
A literatura é de todos, no entanto, esse estado fisiológico caracterizado pela insensibilidade dos sentidos e pelo repouso que proporciona, há quem lhe já tenha por morte ou sono eterno, impede a dádiva literária do povo, aqueles que transcendem o trânsito das cidades, a monotonia dos dias de trabalho, a incerteza do futuro, a impossibilidade da felicidade. A literatura é de todos, mas a literatura não está só nos livros, a literatura está na vida e em tudo o que lhe envolve. A vida, a vida nós sabemos o que é...
Se já não guardam rebanhos, se já não trabalham desde os seis anos de idade para ajudar ao sustento da família numerosa, se já não são analfabetos e vivem numa Europa, que livros e poemas andam a ler? Chateaubriand? Queirós? Pessoa? Rilke? Saramago? Tavares? Só os que lhes dão na escola... o famigerado templo do ensino. Mas quem disse que a literatura está na escola? Sim, claro, a escola faz parte da vida, logo a literatura também está na escola. Todavia, não será a literatura do templo do ensino supérflua e impositiva? A escola é apenas mais um eco do embaraço e desordem dos valores sociais, morais e literários do nosso tempo. É preciso acordar para a insurreição dos valores actuais da literatura! O que é que se ganha em ler? O que é que se ganha em pensar depois de ler? O que é que se ganha em escrever depois de pensar e de ler? Ninguém sabe. Contudo, gosto de acreditar que pela palavra se cria «iluminação», e é desta «iluminação» que todos precisamos para a vida: o conhecimento do Homem está na linguagem.
Incrédulo à passagem dos pensamentos, mais ou menos espirituais, divirto-me com as nuvens intentando maravilhosos novos mundos para lá da imaginação.
Não durmo, respeito-lhes o sono:
«Ler é maçada, estudar é nada.» Fernando Pessoa
Filipe de Fiúza
Fotografia de Vladimir Kulichenko